A Ilha do Cação
Contam os antigos, que há muito tempo, viviam dois irmãos muito unidos na cidade. Não havia demonstração de afeto mais genuíno, preocupação verdadeira e amor fraternal mais intenso que o deles. Eram aqueles parceiros para qualquer tipo de situação, trabalhavam e pescavam juntos. Onde um estava, pode ter certeza que o outro estaria a poucos metros de distância.
Esforçada e trabalhadora, a dupla tinha ambição. Ficar no mesmo lugar por muito tempo não fazia brilhar seus olhos. A rotina monótona logo foi questionada e não demorou muito para que eles cansassem da lavoura e decidissem procurar outro lugar para cultivar e expandir sua plantação. Inusitadamente, o local escolhido foi a Ilha do Cação, uma das maiores do arquipélago da Baía Babitonga.
Já instalados na ilha, os irmãos não perderam tempo e começaram a plantar feijão. Logo os grãos foram aparecendo e a área de plantação foi ampliada. Em uma vistoria de rotina, perceberam que uma parte da lavoura estava destruída. Mesmo assim, eles não se deixaram abater e logo pegaram a enxada para consertar o estrago.
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No dia seguinte, mais uma surpresa: a plantação estava novamente decadente. Ali, a dúvida já estava plantada e o desejo de saber o que tinha estragado o trabalho árduo da dupla aguçou. Eles estavam decididos a descobrir quem ou o que estava prejudicando sua plantação.
Quando a noite caiu e a lua tomou conta da iluminação do local, os irmãos montaram a tocaia. Eles se aproveitaram da penumbra que se formava com a plantação e ficaram escondidos vigiando atentamente, quase como corujas, a tão amada lavoura de feijão.
De repente, um alto barulho cortou o silêncio noturno. O som vinha do mar, era estridente e assustador, pior que unha arranhando o quadro. As águas agitadas se curvavam ao ruído e pareciam reconhecer sua força e poder. Enquanto isso, os irmãos tremiam mais que vara verde. Eles estavam arrepiados de pavor e arrependidos de ficarem na espreita.
Do mar, duas serpentes enormes saíram. Elas rastejavam lentamente enquanto deixavam um rastro na areia. Seus corpos se moveram em direção à plantação e os irmãos acompanharam incapacitados a nova destruição. Elas percorriam o caminho das sombras, evitando ficarem expostas ao singelo luar. Contudo, esse trajeto tinha falhas. Um erro fatal veio acompanhado de uma revelação.
![a-male-farmer-who-is-using-a-shovel-to-dig-the-soil-in-his-rice-fields_edited.jpg](https://static.wixstatic.com/media/ac1c68_0bc40cef47a14f729e8d722ab0cf7be3~mv2.jpg/v1/fill/w_588,h_392,al_c,q_80,usm_0.66_1.00_0.01,enc_avif,quality_auto/ac1c68_0bc40cef47a14f729e8d722ab0cf7be3~mv2.jpg)
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O segredo das duas serpentes tinha sido descoberto. Ao terem contato com um facho de luz, elas se transformaram em duas belas moças. Os irmãos, encantados com a reviravolta, logo foram avistados pelas mulheres que, assustadas, tentaram retornar ao mar.
Enquanto humanas, elas não eram tão rápidas quanto na pele de serpentes, uma delas ficou para trás e rapidamente foi alcançada por um dos irmãos. Ao perceber que não tinha para onde correr e que seu segredo havia sido descoberto, uma declaração saiu de seus lábios. “Você viu meu feitiço sendo quebrado e, agora, me pertence”.
O homem, apavorado, soltou o braço da mulher serpente. Ele não sabia o que fazer com essa declaração, pois, apesar da moça possuir uma beleza surreal, ele estava de casamento marcado. O que não foi levado em consideração, já que, rapidamente, foi enfeitiçado pela mulher.
Sob o domínio mágico da metamorfa, ele voltou ao continente e desfez o noivado aos protestos e lamentos de sua ex. Em transe, o homem retornou aos braços da misteriosa mulher. Na Ilha do Cação, a plantação de feijão continuou a ser cultivada, não mais sob os cuidados dos irmãos, mas sim dos descendentes do casal encantado. O outro irmão, que sempre estava por perto, nunca mais foi visto e a outra serpente sumiu entre as ondas que quebravam na costa. Dizem os antigos que os sucessores do casal fizeram parte da influente sociedade francisquense.